Estudos e Entrevistas

Estudo da USP comprova que gérmen de soja reduz o risco de doença cardiovascular na pós-menopausa.

Dulcinéia Saes Parra Abdalla, profª Drª do Deptº de Análises Clínicas e Toxicológicas da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo, realizou, com a colaboração de cardiologistas do Instituto Dante Pazzanese, o primeiro estudo no País que comprovou a eficácia do gérmen de soja para o sistema cardiovascular de mulheres na pós-menopausa. 

O estudo da Drª Dulcinéia, realizado com o gérmen de soja, comprova que na comparação do efeito da soja com a reposição hormonal convencional ou sintética, simples e combinada o gérmen mostrou resultados positivos, apresentando ações potencialmente benéficas que poderiam contribuir para a redução do risco de doença cardiovascular na mulher na pós-menopausa.
 
O que é a reposição hormonal?

Com a falência ovariana na menopausa ocorre uma redução drástica da produção de estrógeno (hormônio feminino) e com isso uma série de alterações fisiológicas importantes manifestam-se, como aumento do índice de doenças cardiovasculares, fraturas por osteoporose, sintomas vasomotores, ressecamento vaginal etc. A reposição do estrógeno perdido na menopausa poderia prevenir muitas manifestações do envelhecimento, incluindo doenças cardiovasculares, osteoporose e o declínio das funções cognitiva e sexual.

O estudo foi feito apenas com mulheres que apresentaram problemas cardiovasculares (ou com a tendência a desenvolvê-los)? Por quê?

O estrógeno, hormônio feminino, tem ação protetora na redução do risco de doenças cardiovasculares em mulheres (em relação aos homens). 

Quando uma mulher entra na menopausa, a produção de estrógeno é interrompida e, com isso, aumenta o risco de doença cardiovascular. A terapia de reposição hormonal tenta recuperar este déficit, porém, além de ter vários efeitos colaterais, não pode ser usada em mulheres com risco de desenvolver câncer. Assim, estudos recentes têm questionado esta ação protetora da terapia de reposição hormonal. Os resultados indicam aumento do risco de doença cardiovascular com o seu uso. Os fitoestrógenos da soja entram como uma alternativa natural para a terapia de reposição hormonal sem efeitos colaterais comprovados até o momento. Por este motivo, participaram do estudo mulheres hipercolesterolêmicas e hipertensas (fatores de risco para doenças cardiovasculares), mas que não tivessem doença aterosclerótica clinicamente estabelecida.
 
O que são os hormônios naturais?

Os fitoestrógenos são compostos fenólicos de plantas que têm similaridade estrutural com os estrógenos e que, portanto, são capazes de ligar-se a receptores de estrógeno. No Brasil, a fonte mais significativa é a soja, que contém as isoflavonas genisteína, daidzeína e gliciteína e seus glicosídeos.
 
Fale do seu estudo com mulheres na menopausa. Como ele foi conduzido?

Este estudo foi conduzido na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP com a colaboração de cardiologistas do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia de São Paulo, doutores Marcelo Chiara Bertolami e André Arpad Faludi, e do doutor José Mendes Aldrighi da FSP-USP. Participaram deste estudo 60 mulheres hipercolesterolêmicas (com colesterol elevado LDL = 130 mg/dL), com idades entre 50 e 65 anos em menopausa natural há pelo menos um ano.
 
Quais as principais conclusões?

O nosso objetivo foi comparar o efeito do gérmen de soja com a terapia de reposição hormonal simples (17 betaestradiol) e combinada (17 betaestradiol + acetato de noretisterona) por três meses, sobre fatores relacionados ao risco para a doença cardiovascular na menopausa. Neste trabalho, o gérmen de soja apresentou resultados positivos e semelhantes aos do estradiol em relação à inibição da oxidação de lipoproteínas (formação de LDL oxidada, óxidos de colesterol e nitrotirosina) e a vasodilatação (produto derivados do óxido nítrico), apresentando, portanto, ações potencialmente benéficas que poderiam contribuir para a redução do risco de doença cardiovascular na mulher na menopausa.
 
Por que optou por fazer o estudo com o gérmen de soja e não com o extrato de isoflavona?

Vários estudos têm comprovado que as isoflavonas (fitoestrógenos) são mais biodisponíveis quando na forma conjugada (glicosídeos) e associadas à proteína da soja. Portanto, escolheu-se cápsulas de gérmen de soja pelo fato de conter elevada concentração de isoflavonas associadas à proteína da soja, diferentemente dos extratos disponíveis comercialmente.
 
Qual a relação benéfica entre as isoflavonas do gérmen de soja e os receptores alfa e beta do organismo feminino?

Pelo fato de a exposição aos estrógenos induzir proliferação endometrial e aumentar o risco de câncer de mama durante o uso prolongado, tem sido pesquisadas alternativas para a terapia de reposição hormonal. A descrição de um novo receptor estrogênico, receptor beta (ER-b), tem possibilitado a compreensão de efeitos seletivos de substâncias estruturalmente relacionadas ao estrógeno. O ER-b é expresso em diversos tecidos, tais como o tecido ósseo e o sistema vascular. As isoflavonas genisteína e daidzeína, derivadas da soja, ligam-se a receptores estrogênicos, provavelmente por suas similaridades estruturais com estrógenos. 

A afinidade da genisteina ao ER-b é aproximadamente 20 vezes maior que ao receptor alfa (ER-a). Comparando-se com o estradiol, a afinidade de ligação da genisteína e da daidzeína, respectivamente, foi de 4% e 0,1% ao ER-a e de 87% e 0,5% ao ER-b. Isso parece ser importante, pois as isoflavonas teriam uma baixa afinidade pelos receptores alfa, tendo pouca ação nos tecidos onde este receptor é mais abundante, como útero e mama, reduzindo, assim, o risco de induzir proliferação endometrial e aumentar o risco de câncer de mama, e uma maior afinidade pelo ER-b, presente principalmente no sistema vascular, reduzindo, portanto, o risco da doença vascular associada à menopausa.
 
Foi o primeiro estudo realizado no País com esse enfoque?
 
Este foi o primeiro estudo realizado no Brasil que compara a eficiência do gérmen da soja com a terapia de reposição hormonal, abordando os indicadores de lipoperoxidação e metabólicos do óxido nítrico, relacionados aos fatores de risco de doença cardiovascular.

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Drª Dulcinéia Abdalla

Drª Dulcinéia Abdalla

Graduada em Farmácia Bioquímica.